Você não pode ceder um milímetro
O título genérico será compreendido ao final, quando você fizer sua autorreflexão e assumir sua culpa. Os avanços da agenda impositiva politicamente correta constituem o triunfo de quem impõe ou a capitulação de quem adere? Não obstante o questionamento pareça tautológico, não o é. O efeito esperado passa necessariamente pelo impacto psicológico causado nas pessoas. Quando perdemos uma batalha lutando, caímos de pé e sabemos intuitivamente que podemos ainda vencer; quando entramos derrotados e rendidos, o opositor já sabe que nos vencerá em tantas outras pela frente. Você pode não gostar, mas vida animal é isso: jogo psicológico!
Muito antes de discutirmos abertamente sobre politicamente correto, a alemã Elisabeth Noelle-Neumann cunhou a expressão “espiral do silêncio”. Sua tese fora desenvolvida durante as eleições na Alemanha na década de 1940. Neumann percebeu um comportamento estranho nas pessoas que discordavam de teses supostamente majoritárias. Ela notou que indivíduos com opiniões contrárias à (virtual) maioria eram emudecidas sob pena de isolamento social. Ora, ora, se não é exatamente aquilo que hoje apelidamos de politicamente correto: um códex de conduta criado por militantes – normalmente ligados à esquerda –, no qual são dispostos comportamentos, opiniões, modos, palavras e expressões adequados apenas para aqueles que partilham uma visão de mundo muito particular.
Confesso que foram, sim, os últimos acontecimentos que me moveram a trazer uma mensagem tanto de indignação como de conclamação. Os casos envolvendo Jean Wyllys e Donata Meirelles são emblemáticos em demonstrar o quanto a sociedade cedeu à esquizofrenia de uma hipersensibilidade das ditas minorias. Enquanto o primeiro forjou uma situação de perseguição política para posar de exilado, esta sofreu com a intolerância de grupos racialistas defensores dos negros. O fato de Jean ter abandonado quem alega representar e dos organismos mencionados retirarem das mulheres negras seu sustento são consequências pouco ou nada exploradas pela imprensa ou opinião pública, um sintoma da era da pós-verdade.
Mais recentemente, os focos de incêndio na Amazônia foram mais um mote para o ataque histérico de ativistas. A esquerda tupiniquim, em associação espúria com os globalistas, criou uma false flag a respeito do ambientalismo para, de forma escamoteada, capitalizar politicamente. Pouco importaram os fatos comprovados de que os focos estavam abaixo da média histórica, que a maioria dos incêndios ocorrem em áreas já desmatadas para a preparação do solo ou mesmo que, em apenas outros dois países africanos, havia o dobro de focos de incêndio. Nada parece importar ou fazer sentido quando uma mentira já fora embrulhada com a embalagem da verdade.
O politicamente correto avança a galope contra o senso comum. Se antes fincava pés em situações reais, hoje já não esconde sua sanha fantasiosa, num empreendimento dedicado à criação de narrativas ocas, que, mais tarde, de tão introjetadas, convertem-se em axiomas. Não se iluda: o objetivo é esse – repetir a mentira tantas vezes seja necessário para que dela surja uma causalidade inexorável pela familiaridade fraseológica (Daniel Kahneman). Um cérebro pouco treinado e um indivíduo não imunizado (Andrew Lobaczewski) são presas fáceis para o sentimentalismo tóxico (Thedore Dalrymple).
Você não pode ceder um milímetro. Quando você aceita o rótulo ou a pecha, já entra no ringue nocauteado. Se usa a terminologia do seu opositor, joga com as regras criadas unilateralmente por ele – seu destino é ser derrotado. O feminismo birrento e revanchista tem como maior culpado cada homem decente que aceitou o epíteto de opressor machista; cada militar chamado de fascista é responsável pela humilhação a que se submeteu acovardando-se no debate; os brancos tem sua parcela de contribuição pelo fato ocorrido com Donata, pois durante décadas encampam o discurso de que todos são racistas; e todos em geral sentirão o remorso por terem aceito o fim do dia dos pais ou das mães em escolas em nome de uma suposta proteção à criança ou por entenderem que a única forma viável de destruir o preconceito é acatando a ideologia de gênero.
Quando você cede um milímetro, o princípio da inércia foi rompido e a cadeia cismogenética (Gregory Bateson) tem seu curso. Ao ceder, não há um novo início do ponto de partida, mas mero reinício de onde você cedeu. Logo, seu opositor “andou casas” e “conquistou territórios”; você, inerte, assiste à cena como mero espectador, como quem contempla o precipício à sua frente. Aprenda de uma vez: você não pode ceder um milímetro!