Ao conjunto de regras e princípios orientadores da conduta dos homens para consigo mesmo e para com a comunidade damos o nome de moral. Poderíamos dizer que a moral é uma espécie de “gabarito de prova da vida”: a conformidade às melhores regras (que tornam o homem mais humano) são chamadas de virtudes, e a não-conformidade, vícios.
Por ter a capacidade de criar imagens mentais, o homem dotado de tal “gabarito” pode escolher melhor. Se o conhecer bem conseguirá antever situações, traçar causas e consequências de atos e será tanto melhor no seu agir social quanto mais conseguir se colocar no lugar do outro, ou seja, criar empatia.
Assim, os homens podem enunciar e comunicar tais conclusões, ou “divulgar o gabarito” de duas maneiras: por conceitos (leis morais) e por narrativas (parábolas e histórias).
A narrativa, por sua vez, é o modo fundamental e mais natural do homem compreender a realidade. Não é só uma ferramenta explicativa, mas é o modo como expressamos a realidade que experimentamos.
É dentro da narrativa que nossas experiências são enquadradas em circunstâncias culturais e comparadas a outras situações semelhantes já ocorridas conosco ou que temos notícia, muitas vezes por analogias e metáforas, ou seja, pela criação de símbolos. Tal capacidade nos permite conhecer os conceitos universais que estão na base da experiência humana e nos ajuda a abrir o leque das alternativas de ação, antecipando as possíveis decisões para o caso concreto.
Dentro da narrativa, a compreensão moral estruturada pela imaginação desenvolve a capacidade empática do ser humano e insere o sujeito na esfera comunitária, uma vez que as opções morais são raciocinadas dentro de um contexto mais ou menos comum a todos os membros da sociedade. O desenvolvimento dessas capacidades impede o subjetivismo das visões meramente estéticas do uso criativo da razão, e evita a instrumentalização das relações humanas. A narrativa moral é humanizadora e civilizatória.
Assim, para Russell Kirk a faculdade raciocinante da “imaginação moral” é o “tempero” da boa narrativa. É tal faculdade o que nos possibilita discernir a potencialidade da pessoa humana, já que por intermédio da imaginação moral a pessoa passa a apreender, por metáforas e alegorias, a correta ordem da alma e a justa ordem da sociedade, aprende a diferenciar o verdadeiro e o falso, o bem e o mal, o belo e o feio, além ser apresentada a uma correta visão da lei natural e da natureza humana.
Dentre os vários tipos de narrativa que podem trazer elementos de imaginação moral, são as narrativas do tipo mítico ou fantástico as que mais evidenciam o conteúdo moral.
Livre para constituir o mundo que lhe aprouver, a fantasia é “o mais visionário dos gêneros ficcionais: interligado a todas as artes pela verdade emocional, é mais livre do que qualquer outra forma literária para escapar da mera realidade”, segundo a escritora de fantasia Diana Waggoner. Diz ainda que “A fantasia desperta uma nova visão, não de sonhos estranhos e exóticos, mas da realidade comum. […] A fantasia restaura e resgata nosso próprio mundo. […] Ler fantasia é escapar do mal não por ignorá-lo, mas por reconhecer o bem; fugir da realidade para vê-la como realmente é”.
Dessa maneira, podemos afirmar que as narrativas fantásticas proporcionam um senso de estrutura e de regras que permitem a fixação do conteúdo moral e, enquanto tal estória persistir na memória, as coisas reais passam a indicar algo mais do que elas mesmas. A descoberta desse poder nos enche de maravilhamento e nos faz responder à realidade com um sentimento de gratidão, permitindo-nos vislumbrar o sentido sacramental da criação e acender o senso de mistério. Isso provoca o estupor diante da grandeza da realidade, agora temperada com um “algo além” da mera materialidade do mundo. Ao tornar presente no cotidiano uma realidade divina, o mais simples ato humano se enche de excepcionalidade.
Como disse o poeta renascentista inglês Edmund Spencer, com o aparato imaginativo, a pessoa passa a ter uma “biblioteca de memórias […] cheia de maravilhas no sótão da mente”.